| Resumen: | Com o objetivo de trazer novas contribuições aos estudos sobre homicídio de mulheres no Brasil, este trabalho propõe empreender uma análise que explicite as mudanças e permanências pertinentes às vulnerabilidades femininas à violência letal, ao expor manifestações que divergem dos padrões de feminicídio previstos no direito penal brasileiro, assim como ao apresentar de que maneira se desenrola a violência de gênero letal hoje, situando o tema dentro das atuais dinâmicas do patriarcado, do capitalismo e do racismo. Questiona-se uma assunção corrente nos estudos sobre homicídios de mulheres, que afirma ser sobretudo em razão de violência doméstica, ou sob outras agressões de cunho sexual, que as mulheres morrem. Parte-se da hipótese de que no atual contexto dos sistemas de opressão de gênero, classe e raça não é mais possível fazer inferências nesse sentido. Argumenta-se que a inserção das mulheres nos espaços públicos e sua maior suscetibilidade ao mercado e ao Estado (patriarcais, neoliberais e racistas), com a guerra às drogas como estratégia de neutralização social nesse contexto, produzem novas vulnerabilidades à violência, tornando essas agressões mais diversas do que se supõe. Para verificar essa hipótese, foi realizada uma pesquisa quanti-qualitativa a partir de inquéritos policiais de homicídios de mulheres ocorridos entre 2013 e 2017, nas cidades de João Pessoa e Porto Alegre.Na análise quantitativa, buscou-se identificar primordialmente o motivo do crime e o uso de violência sexual na prática do delito, relacionando esses dados com outros elementos situacionais, o perfil da vítima e alguns aspectos sobre os autores do delito (quando de possível identificação). Identificou-se que o feminicídio – operacionalizado como o crime com motivação baseada no gênero e/ou com uso de violência sexual – foi responsável por 14,3% dos casos de homicídios em cada uma das duas cidades, número abaixo dos cerca de 40% apresentados em diversos outros estudos; ao passo que os homicídios motivados por conflitos ligados ao narcotráfico, sem presença de violência sexual, foram os principais responsáveis pelas mortes de mulheres, vitimando 55,5% das mulheres em Porto Alegre e 39,7% em João Pessoa. Na análise qualitativa, buscou-se aprofundar e trazer reflexões sobre os dados coletados, também realizando um contraponto com algumas pesquisas anteriores relacionadas ao tema. Dentre alguns pontos, ressaltou-se que o feminicídio, ainda que menos prevalente que outrora em algumas cidades, permanece vitimando de maneira relevante as mulheres, adquirindo manifestações que representam uma reação ao empoderamento feminino e ao poder masculino perdido, mais que propriamente o exercício de violências sobre uma mulher frágil, dependente e restrita ao lar.
With the objective of bringing new contributions to studies on homicide against women in Brazil, this work proposes to undertake an analysis that makes explicit the changes and permanencies pertinent to female vulnerability to lethal violence; exposing manifestations that diverge from the standards of femicide as provided for in Brazilian criminal law, as well as presenting how lethal gender violence unfolds today, placing the theme within the current dynamics of patriarchy, capitalism, and racism. A current assumption in studies on homicides of women is questioned, which states that women die mainly due to domestic violence, or other aggressions of a sexual nature. It is therewith assumed that in the current context of the systems of oppression of gender, class and race, it is no longer possible to make inferences of this type. It is argued that from their insertion into public spaces, arrives their greater susceptibility to the market and to the State (being patriarchal, neoliberal, and racist), and in this context, that the war on drugs being a strategy of social neutralization, then produces new vulnerabilities to violence, making such aggressions more diverse than is supposed.To verify this hypothesis, quantitative-qualitative research was carried out based on police investigations of homicides against women, between 2013 and 2017, in the cities of João Pessoa and Porto Alegre. In quantitative analysis, we sought primarily to identify the motive for each crime and the use of sexual violence in the practice of the crime, relating these data to other situational elements, the profile of the victim, and to aspects concerning the perpetrator of the crime (when possible to identify). It was identified that femicide - operationalized as a crime motive based on gender and/or using sexual violence - was responsible for 14.3% of homicide cases in each of the two cities studied, below the roughly 40% presented in several other studies. Homicides motivated by conflicts related to drug trafficking, without the presence of sexual violence, were mostly responsible for the deaths of the women, victimizing 55.5% of women in Porto Alegre and 39.7% in João Pessoa. In qualitative analysis, we sought to deepen and bring certain reflections concerning the data collected, performing counterpoints to previous research related to the theme. Among points, it is emphasized that femicide, although less prevalent in the two cities studied than in certain other cities, notably continues against women, and more than an exercise of violence against a fragile, and dependent woman, restricted to the home, it acquires manifestations that represent a reaction to both female empowerment and lost male power. |
