Cinema novo a partir da perspectiva de gênero: as mulheres em os cafajestes, os fuzis e os deuses e os mortos (Ruy Guerra/1962/1965/1970)

Abstract

Ao longo da primeira metade da década de 1960, o Brasil testemunhou um momento de renovação do meio cinematográfico, tendo como principal fator o desenvolvimento do Cinema Novo. Este foi um movimento cinematográfico formado majoritariamente por homens brancos de classe média e classe média alta, e situado no Rio de Janeiro. Tendo como objetivo filmes voltados para a crítica à realidade brasileira e realizados por meio de uma linguagem inovadora, o Cinema Novo revolucionou o cinema nacional. Contemporâneo à "revolução sexual" e ao fortalecimento dos feminismos, o movimento não teve como problemática a condição social das mulheres. Uma análise história, a partir da perspectiva de gênero, sobre como as mulheres foram inseridas nas narrativas cinemanovistas permite identificar de que forma os integrantes do movimento as compreendiam dentro da realidade brasileira que buscavam retratar. Desta forma, esta dissertação tem como objetos-fontes os três filmes que Ruy Guerra dirigiu e roteirizou enquanto cinemanovista: Os cafajestes (1962), Os fuzis (1965) e Os deuses e os mortos (1970).Tem-se como objetivo geral identificar, através da análise de como as mulheres estão inseridas na narrativa, testemunhos sobre as relações e os arranjos de gênero do período. Como objetivos específicos, visa-se investigar de que forma as cenas de estupro e violência sexual são feitas e em que contexto ocorrem; e tendo em vista a recusa à fórmula hollywoodiana por parte do Cinema Novo, avaliar se as personagens femininas de Ruy Guerra são construídas como um contraponto às do Cinema Clássico. Baseando-se na teoria feminista do cinema, utiliza-se a análise fílmica para analisar as obras. Ao término da pesquisa, é possível perceber que os três filmes seguem a lógica patriarcal própria da ordem de gênero da sociedade brasileira da época, apresentando a violência e a violência sexual contra as mulheres como fenômenos próprios e naturais do comportamento masculino.

Throughout the first half of the 1960s, aiming at films focused on the critique of brazilian reality and made using an innovative language, Cinema Novo revolutionized national cinema. Cinema Novo was a cinematographic movement formed mainly by white men of the middle class and upper middle class, located in Rio de Janeiro. Contemporary to the "sexual revolution" and the strengthening of feminisms, the movement did not have the social condition of women as a problem. A historical analysis, from a gender perspective, on how female characters were inserted in the cinemanovista narratives, allow to identify which form the members of the movement understood women within the brazilian reality that they sought to portray. In this way, this dissertation has as objects and sources the three films that Ruy Guerra directed and scripted as a cinemanovista: Os cafajestes (1962), Os fuzis (1965) and Os deuses e os mortos (1970). The general objective is to identify, through the analysis of how women are inserted in the narrative, testimonies about the gender relations and the gender arrangements of the period. As specific objectives, we aim to investigate how the scenes of rape and sexual violence are made and in what context they occur; and in view of Cinema Novo's refusal of the Hollywood formula, assess whether Ruy Guerra's female characters are constructed as a counterpoint to those of Classic Cinema. Based on the feminist theory of cinema, film analysis is used to analyze the films. At the end of the research, it is possible to notice that the three films follow the patriarchal logic inherent to the gender order of brazilian society at the time.