Resumo: | A criação científica e a literária estão fundadas em uma percepção que, muitas vezes,
supera a barreira da realidade factual, transformando-se em um desejo de conhecer e ser
conhecido, independentemente da metodologia empregada. Quando escritores escrevem
tendo como inspiração a ciência e cientistas escrevem romances, nota-se uma tentativa de
ultrapassar esse abismo que separa literatos e cientistas. Contudo, no caso do escritor
argentino Ernesto Sabato (1911-2011), percebe-se justamente o contrário, pois, em seus
ensaios, encontra-se, muitas vezes, uma postura radical contra o pensamento científico e
os avanços tecnológicos. Essa posição permitiu o seguinte questionamento: será que essa
“aversão” a tudo o que diz respeito à ciência é concretizada nos seus romances? Nesse
sentido, a hipótese central desta tese é de que nas três obras literárias de Ernesto Sabato
– El túnel (1948), Sobre héroes y tumbas (1961) e Abaddón el exterminador (1974) –
podem ser encontrados elementos ou ideias que apontam para uma rejeição ao
pensamento científico que aparecem com frequência nos ensaios. Para identificar e
caracterizar esses elementos, a metodologia empregada foi a análise de conteúdo e o
corpus esteve constituído não só dos três romances já citados, como também de nove
obras ensaísticas: Uno y el universo (1945), Hombres y engranajes (1951), Heterodoxia
(1953), El escritor y sus fantasmas (1963), Tango discusión y clave (1963) e Tres
aproximaciones a la literatura de nuestro tiempo (1968), Apologías y rechazos (1979),
Antes del fin (1998) e La resistencia (2000). Assim, na análise dos ensaios sabatianos
percebeu-se uma rejeição aos fundamentos da ciência moderna – abstração, rigor, lógica,
neutralidade –, com o autor considerando-os responsáveis pela crise na qual o homem
contemporâneo se encontra. Quando o tema é a literatura, constata-se uma necessidade
de reafirmar que somente ela seria capaz de resgatar o homem dessa tenebrosa estrutura
dos tempos modernos. Esses pontos de vista antagônicos aparecem na escolha das obras
e autores que formaram o cânone literário de Ernesto Sabato – Fiódor Dostoievski, Paul
Valéry, Edgar Allan Poe, Jean-Paul Sartre e Jorge Luis Borges –, elogiando-os e
criticando-os conforme as posições que adotaram quando o tema era a ciência. Nos
romances, suas concepções sobre a ciência estão presentes, principalmente, na forma
como constrói seus personagens, pois, ao criar indivíduos paranoicos (Juan Pablo Castel
e Fernando Vidal Olmos), ele dá destaque a todas aquelas características associadas ao
pensamento científico, demonstrando sua repulsa a essa visão de mundo que valoriza a
abstração, a lógica e a imparcialidade em detrimento do espírito humano. Já ao criar
personagens envolvidos com o processo de escrita (Bruno, “Sabato”, “S”), o autor não só
quer comunicar seu conceito de literatura, como expor a sua função em um mundo que,
segundo ele, está dominado pelas abstrações científicas. Desse modo, foi possível
demonstrar que a aversão pela ciência exposta por Ernesto Sabato em seus ensaios
concretiza-se na construção de seus romances, em especial no discurso de seus
personagens. No entanto, também foi possível observar que essa aversão reiteradamente
manifestada pelo autor, se tornou, mesmo que à revelia dele, material literário. Scientific and literary creation are founded on a perception that often overcomes the
barrier of factual reality, becoming a desire to know and to be known, regardless of the
methodology employed. When writers write inspired by science and scientists write
novels, it possible to see an attempt to overcome this gap between literati and scientists.
However, in the case of the argentine writer Ernesto Sabato (1911-2011), in can be
noticed the opposite, since his essays often find a radical stance against scientific thinking
and technological advances. This position allowed the following question: is this
"aversion" to everything that concerns science materialized in his novels? In this sense,
the central hypothesis of this thesis is that in the three literary works of Ernesto Sabato –
The tunnel (1948), On heroes and tombs (1961) and The angel of darkness (1974) – can
be found elements or ideas that point to a rejection of scientific thinking, which often
appears in essays. To identify and characterize these elements, the methodology used was
content analysis and the corpus was constituted, not only of the three novels already
mentioned, but also of nine essayistic works: Uno y el universo (1945), Hombres y
engranajes (1951), Heterodoxia (1953), El escritor y sus fantasmas (1963), Tango
discusión y clave (1963) y Tres aproximaciones a la literatura de nuestro tiempo (1968),
Apologías y rechazos (1979), Antes del fin (1998) y La resistencia (2000). Thus, in the
analysis of the “sabatianos” essays a rejection of the foundations of modern science -
abstraction, rigor, logic, neutrality - was perceived, with the author holding them
responsible for the crisis in which contemporary man finds himself. However, when the
subject is literature there is a need to reaffirm that only it would be able to rescue man
from this dark structure of modern times. These antagonistic points of view appear in the
choice of the works and authors that formed his literary canon – Fiódor Dostoievski, Paul
Valéry, Edgar Allan Poe, Jean-Paul Sartre and Jorge Luis Borges – praising and
criticizing them according to the positions they adopted when the subject was science. In
the novels, his conceptions of science are present mainly in the way he builds his
characters, because in creating paranoid individuals (Juan Pablo Castel and Fernando
Vidal Olmos) he highlights all those characteristics associated with scientific thought,
demonstrating his repulsion to this point of view that values the abstraction, logic and
impartiality over the human spirit. However, by creating characters involved with the
writing process (Bruno, “Sabato”, “S”) he not only wants to communicate his concept of
literature, but also to expose its role in a world that, according to him, is dominated by
scientific abstractions. Thus, it was possible to demonstrate that the aversion to science
exposed by Ernesto Sabato, in his essays, is materialized in the construction of his novels,
especially in the discourse of his characters. However, it was also possible to observe that
this aversion, repeatedly expressed by the author, became, even if against his will, literary
material. |